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De acordo com o Censo de 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), nosso país possui mais de 46 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, o que equivale a 24% da população.

Recentemente, o IBGE divulgou uma releitura dos dados do Censo de 2010, utilizando a abordagem proposta pelo Grupo de Washington. Este grupo está subordinado à Comissão de Estatística das Nações Unidas e tem como objetivo padronizar definições, conceitos e metodologias para que seja possível efetuar comparações entre estatísticas de diferentes países.

Nessa nova forma de interpretação dos dados o IBGE chegou ao número de 12,5 milhões de brasileiros com deficiência, ou seja, 6,7% da população.

Para identificar as pessoas com deficiência, na pesquisa por amostragem de domicílios é investigado o grau de domínio que as pessoas possuem de suas funções centrais (ver, ouvir, movimentar-se, pensar, etc.), importantes na participação da vida em sociedade, de forma que os entrevistados respondem sobre suas dificuldades em relação a estas funções centrais, utilizando como parâmetro uma escala indicando possuir “nenhuma dificuldade”, “alguma dificuldade”, “muita dificuldade” ou “não consegue de modo algum”.

Na leitura inicial dos dados, o IBGE considerou pessoa com deficiência os entrevistados que indicaram possuir alguma ou muita dificuldade e aqueles que não conseguia de modo algum ter o domínio de suas funções centrais. Nesta nova abordagem, foram consideradas pessoas com deficiência apenas aquelas que disseram ter muita dificuldade ou não conseguem de modo algum. Ou seja, a nota de corte está mais severa.

Uma vez que estes indicadores são utilizados pelos estados e municípios no planejamento e nos investimentos em infraestrutura de mobilidade das cidades, podemos dizer que esta mudança afeta diretamente não somente às pessoas com deficiência, mas a todos os cidadãos.

Além da preocupação gerada pelos dados do IBGE em relação à referência que representam na elaboração de políticas públicas de inclusão, fica a reflexão sobre a definição do conceito de pessoa com deficiência utilizada na metodologia empregada pelo IBGE, que me parece muito mais próxima do modelo médico de deficiência. Neste modelo, a deficiência é uma “patologia”, de forma que o corpo da pessoa possui funções físico, intelectual ou sensorial “fora dos padrões de normalidade”, imputando a deficiência unicamente à pessoa, tornando-a um “paciente” a espera de uma cura.

Esta definição de deficiência não é mais utilizada desde a década de 80. Além disso, não converge com a Declaração Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, da qual o Brasil é signatário, bem como a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, onde é utilizado o modelo social de deficiência.

Neste modelo, a deficiência é um desajuste entre as habilidades potenciais de atuação em sociedade de cada pessoa e o suporte que o ambiente oferece para o desenvolvimento dessas habilidades. Neste modelo, a sociedade é responsável por providenciar os meios necessários para que todas as pessoas possam conviver e se desenvolver na sociedade, de forma equiparada e harmoniosa, independentemente de suas características físicas ou habilidades.

Diante disso, fica a apreensão sobre os dados que temos para a realização do planejamento de nossas políticas públicas. Primeiramente, porque parecem não corresponder à realidade, visto que as perguntas para identificação do grupo “pessoas com deficiência” são subjetivas e baseadas em um modelo ultrapassado e que não condiz com os valores expressos em nossa legislação e em segundo lugar, porque a análise sugerida pela nova metodologia utilizada pelo IBGE dá margem para um planejamento de políticas públicas possivelmente distorcidas e que não atendem aos anseios e à necessidade da população.

Que tal participar deste debate e acompanhar de perto estas medidas?

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